TJRS suspende parte da Lei Kiss

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul suspendeu liminarmente parte da Lei Complementar 14.376/13, que estabelece regras de segurança e prevenção contra incêndio no Estado, conhecida como Lei Kiss. A decisão do Órgão Especial do TJRS, do último dia 15/5, permite aos Municípios que, observadas as regras locais existentes sobre o tema, concedam aos estabelecimentos autorizações ou renovações precárias ou provisórias, enquanto se aguarda a confecção e entrega do Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (APPCI) definitivo.

Caso

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) foi ajuizada por 55 Municípios gaúchos, que questionavam diversos itens da Lei Complementar. Para os autores, a Assembleia Legislativa, na ânsia de dar uma resposta à sociedade, após o trauma coletivo do incêndio na boate Kiss (que resultou em 242 mortos e mais de 600 feridos), ocorrido em Santa Maria em 27/01/13, teria elaborado apressadamente a legislação.

Argumentam os autores que foram atropelados princípios e regras das Constituições Federal e Estadual. Segundo eles, a proposição feriu cláusulas pétreas que garantem a separação de Poderes e a forma federativa de Estado, desrespeitando a autonomia dos entes federados municipais.

Sustentam também já existirem normas de segurança suficientes que regem o setor, bastando apenas que sejam cumpridas e que seja fiscalizada sua observância.

Os Municípios questionaram especialmente o art. 5° da Lei Kiss, cuja redação inviabiliza a concessão de licenças e alvarás municipais, ou sua renovação, pois condiciona tais procedimentos à apresentação do APPCI definitivo expedido pelo Corpo de Bombeiros.

Decisão

O Desembargador Eugênio Facchini Neto é o relator do processo no Órgão Especial. O magistrado afastou de forma preliminar a inconstitucionalidade da lei. Ao analisar o caso, considerou que a tragédia ocorrida em Santa Maria mostrou a precariedade de estabelecimentos de frequência coletiva, quanto ao quesito segurança dos seus usuários. E que a Lei Kiss não pode ser tida como apressada.

A enorme pressão pública fez com que a tramitação fosse mais rápida do que o que ocorre com outras leis, mas isso não significa que as soluções que ela albergou não tivessem sido amplamente debatidas na esfera pública. Os municípios certamente tiveram condições de intervir no referido debate, ou através de pareceres, ou através dos deputados representantes da sua região, asseverou o relator.

O Desembargador Facchini também ressaltou que a Lei Complementar disciplina de forma relativamente minuciosa a atuação do Corpo de Bombeiros na seara de prevenção de incêndios, o que é de competência do Estado, através da Assembleia Legislativa.

Liminar

Entretanto, o magistrado entendeu que, em relação à parte do art. 5° da legislação questionada, sua aplicação literal poderá ficar comprometida, conduzindo à paralisação da concessão de novas licenças ou de renovação das existentes. Isso porque é de se reconhecer que efetivamente o Corpo de Bombeiros não possui efetivo suficiente para fazer frente à gigantesca demanda que se anuncia. Cada estabelecimento deverá ser visitado e praticamente periciado, a fim de ser expedido o referido APPCI. Considerando o número de estabelecimentos existentes, é previsível que haverá um manifesto gargalo, com longo período de espera, considerou o Desembargador Eugênio Facchini Neto.

Assim, foi suspensa a vigência das expressões precárias e provisórias, constantes no caput do art. 5° da Lei Complementar 14.376/13, mantida, por ora, a vigência dos demais dispositivos legais.

Por óbvio que se está sugerindo que se leve a sério o sentido das expressões “precário” e “provisório”, que apontam para algo muito distinto de permanente, estável, duradouro ou definitivo. Por óbvio, também, que a autoridade municipal competente está assumindo o ônus da responsabilidade da concessão de tais licenças precárias ou provisórias, analisando cada caso para verificar a ausências de riscos, diante das circunstâncias concretas. Salutar, também, que exigisse a autoridade municipal que a parte interessada ao menos comprovasse a solicitação do APPCI, concluiu o relator.

ADIn n° 70059805416