16 jun Saúde mental no trabalho: o que muda a partir da nova regulamentação?
Por muito tempo, a saúde mental foi tratada como um tema secundário no ambiente corporativo. No entanto, esse cenário está prestes a mudar — e não apenas por consciência, mas por obrigação legal. A mais recente atualização da Norma Regulamentadora NR-1 marca um divisor de águas ao equiparar, pela primeira vez, a saúde mental à saúde física nas empresas.
A partir de 26 de maio, todas as organizações deverão implementar mecanismos internos capazes de identificar e gerenciar o estresse, o assédio e a sobrecarga emocional no ambiente de trabalho. Não se trata mais de um benefício opcional oferecido aos colaboradores – se trata de um dever.
Assim como há a exigência de fornecer protetores auriculares em ambientes barulhentos, agora será necessário mapear os riscos psicossociais associados a cada atividade — metas excessivas, jornadas exaustivas, número de afastamentos por doenças psicológicas — e adotar medidas concretas para mitigá-los.
Isso exigirá não apenas uma revisão de protocolos e práticas, mas também um compromisso genuíno com a construção de ambientes mais humanos. As empresas deverão atualizar seus documentos e avaliações relacionadas aos riscos ocupacionais, tal como já fazem com os riscos físicos, químicos e biológicos. Também precisarão elaborar planos de ação e medidas preventivas, como treinamentos, palestras e suporte psicológico. Entre as recomendações da NR-1, está a adoção de programas de Primeiros Socorros Psicológicos (PSP), que oferecem apoio imediato a trabalhadores em crises emocionais.
Essa avaliação deverá estar incluída no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), documento obrigatório para empresas de todos os portes e que precisará ser disponibilizado para fiscalização do Ministério do Trabalho a qualquer momento.
As mudanças na NR-1 são uma tentativa de equilibrar os números: no ano de 2023, 38% de todas as licenças concedidas pelo INSS no Brasil foram por transtornos mentais, o que causa uma preocupação para empresas, trabalhadores e, claro, para toda a sociedade. A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que 12 bilhões de dias de trabalho são perdidos anualmente devido à depressão e à ansiedade, custando à economia global quase US$ 1 trilhão.
Durante muito tempo, expressar o desejo de trabalhar menos era visto com maus olhos. Hoje, cada vez mais pessoas reconhecem a dificuldade de equilibrar todos os aspectos da vida e a necessidade de mais tempo para outras demandas. Além disso, discussões recentes sobre produtividade desmistificaram a ideia de que trabalhar mais significa produzir melhor. Pelo contrário: o excesso de trabalho compromete a qualidade da entrega.
O que se espera com as novas regras é o aumento da produtividade, a redução de afastamentos, a melhoria do clima organizacional, bem como a atração e retenção de talentos. Para as empresas, cuidar da saúde mental de suas equipes não é apenas uma exigência legal, mas uma evolução necessária. O custo de ignorar essa realidade pode ser alto — em multas, interdições e, sobretudo, em capital humano.
Kerlen Costa
*Advogada da área Trabalhista e Gestão de RH do escritório SCA – Scalzilli Althaus