30 jul Novo CPC e os departamentos jurídicos
Em uma pesquisa realizada pela Lexis Mantindale, publicada em 2010, gestores de departamentos jurídicos apontaram que sua maior fonte de preocupação estava no contencioso e no controle de contingências. Neste contexto, o projeto do novo código de processo civil (CPC), que está atualmente em trâmite no Senado Federal, precisa ser analisado com atenção pelas empresas.
O projeto do novo CPC prevê a possibilidade da atribuição dinâmica do ônus da prova, o que significa dizer que o réu, em determinadas situações, pode ter que suportar o ônus de demonstrar que as alegações do autor não merecem prosperar. Esta técnica processual corresponde a uma inversão do que naturalmente ocorre nas lides cíveis ordinárias, onde cabe ao autor – e não ao réu – comprovar as razões de suas alegações. Esta previsão, caso em vigor, reforça a necessidade de os departamentos jurídicos cuidarem de uma eficiente gestão de informação, cabendo garantir o zelo pela gestão do histórico dos fatos, dos contratos e de todos os dados que naturalmente fazem parte da rotina dos negócios da empresa.
Outro importante aspecto corresponde ao foco do projeto do novo CPC de buscar respostas mais céleres por parte do Poder Judiciário na solução dos conflitos que lhe são apresentados; adotando-se técnicas processuais que podem acelerar ou o julgamento da própria lide ou a inversão do ônus do tempo, com o deferimento de medidas antecipatórias de mérito. De acordo com o projeto, o juiz poderá sentenciar a lide de forma parcial quanto aos pedidos que não demandam uma maior instrução probatória, devendo a ação prosseguir quanto aos demais pedidos que dependam de prova. Com o mesmo espírito, o projeto prevê que o magistrado poderá antecipar os efeitos da sentença independentemente da presença do perigo da demora, quando se convencer que as alegações do autor estão em conformidade com teses já consagradas nos tribunais e apenas dependam de prova documental (tutela de evidência). Na mesma linha, o projeto do novo CPC apresenta a marcante característica de prestígio aos precedentes, sempre em busca da uniformização de jurisprudência, de tal sorte que existem previsões permitindo julgamentos mais céleres quando as teses de direito já tenham sido uniformizadas pelas cortes judiciais. Também guardam o mesmo foco as previsões que determinam que a apelação terá efeito devolutivo amplo e que limitam as hipóteses de manejo do agravo de instrumento, havendo o manifesto objetivo de garantir a fluência do trâmite processual. O projeto do novo CPC ainda adota muito incentivo à prática de atos processuais por meio eletrônico, na busca de obter-se maior dinamismo ao processo.
O projeto CPC demandará dos departamentos jurídicos prévio estudo de custo e benefício de se litigar
Este cenário sinaliza para um processo que pode vir a tramitar de forma mais célere, o que já reforça a necessidade de os departamentos jurídicos estabelecerem um atento diálogo com o departamento financeiro da empresa; tudo de modo a prever-se a materialização das contingências no decorrer do trâmite processual, bem como de modo a garantir uma devida gestão das provisões judiciais. O contexto de um trâmite processual mais célere tende a fornecer ao gestor do departamento jurídico os elementos para a obtenção de uma mais rápida conclusão sobre as chances de êxito de um determinado caso. Técnicas mais acentuadas de uniformização de jurisprudência, bem como técnicas que tendem a acelerar o início da fase de execução, podem ser importantes dados para auxiliar o gestor a compreender o melhor momento para adequar a classificação de êxito de uma determinada demanda.
O projeto do novo CPC também demandará dos departamentos jurídicos um prévio estudo sobre o custo e benefício de se litigar no Poder Judiciário. Seja porque existe tendência de apoio ao uso de mecanismos que possam levar a uma composição amigável e/ou a uma solução alternativa da controvérsia; seja porque há forte prestígio à uniformização de jurisprudência e ao respeito a precedentes judiciais, o que tende a incentivar a parte demandante a analisar se sua tese de direito comporta proteção judicial. Vale dizer que a análise do custo e benefício de uma determinada demanda se intensifica ao se considerar que uma ação improcedente pode levar a parte vencida, caso insista em manejar recursos, a pagar honorários de sucumbência no teto máximo previsto em lei (20%); majorando-se o custo de gestão do contencioso.
Gestão de informação, gestão de contingências e de provisões e análise prévia de custo e benefício de se litigar, são apenas alguns dos impactos que certamente o projeto de um novo CPC trará para os departamentos jurídicos.
Elias Marques de Medeiros Neto é doutor e mestre em direito processual civil pela PUC-SP, professor de direito processual civil na Unimar, Mackenzie, EPD, e PUC-SP e diretor jurídico da Cosan – head of litigation
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