Juiz explica reforma e venda de ativos

Na segunda matéria sobre o Hospital e Maternidade São Marcos, o juiz de direito Altair Guerra da Costa, da 1ª Vara Cível, fala sobre a venda de parte do patrimônio do hospital e o acerto com os ex-funcionários.

FN: O hospital foi arrendado para o Instituto Pedro Ludovico e será reaberto em maio. Outras hipóteses foram cogitadas, como municipalização do hospital, retorno para a mantenedora ou outras?
Dr. Altair: Cogitou-se em transferir o estabelecimento de saúde ao poder público, especialmente o municipal, mas essa opção foi descartada porque importaria no calote aos credores do hospital. Em relação a administração afastada pela decisão judicial, o quadro associativo era composto, em sua maioria, por clubes de serviços (Lions, Rotary e lojas maçônicas), os quais, de fato, não eram mantenedores do hospital, porque não aportavam recursos para a instituição.

FN: Todos os ex-funcionários já receberam? O que está em aberto?
Dr. Altair: Ainda não. No início do processo judicial, o hospital mantinha um quadro de aproximadamente 170 funcionários, dos quais mais de 80 foram dispensados de imediato. Esses primeiros funcionários dispensados ingressaram com ações trabalhistas, coletivas ou individuais. Na ação trabalhista coletiva, o juiz da recuperação judicial autorizou a dação em pagamento (entrega como pagamento) do imóvel onde funcionava o laboratório, avaliado em R$ 392.000,00 e que não foi vendido em hasta pública (leilão) por falta de interessado, para amortização da dívida. O lote onde funcionava o estacionamento do hospital foi vendido em leilão judicial pelo valor da avaliação, ou seja, R$ 151.000,00 e o imóvel onde funciona o NAPEO foi vendido ao próprio ocupante do bem pelo valor de R$ 406.000,00, dos quais o comprador pagou a entrada no valor de R$ 255.000,00 e assumiu a obrigação de pagar o restante até o primeiro semestre de 2013. Os valores apurados com esses imóveis foram direcionados para a Justiça do Trabalho, que quitou as verbas trabalhistas devidas na ação coletiva, enquanto que as dívidas trabalhistas reconhecidas nas ações individuais estão aguardando o julgamento de recursos ou na fase de liquidação (cálculo da Justiça do Trabalho) ou, ainda, de habilitação perante o processo de recuperação judicial.

No início de novembro/2011, foram dispensados o restante dos funcionários – aproximadamente 90 –, com a suspensão das atividades hospitalares para reforma e ampliação. O administrador judicial utilizou recursos obtidos com recebimento de créditos (Ipasgo, Unimed, etc.) e, somado a uma parte do dinheiro da venda do imóvel ao NAPEO, remetido pela Justiça do Trabalho, pagou as verbas rescisórias desses últimos funcionários dispensados, cujos direitos individualmente não ultrapassaram R$ 4.000,00, e pagou parcialmente – R$ 3.000,00 para cada um – 16 funcionários que tinham direito a valores mais elevados. Esse saldo devedor, de aproximadamente R$ 67.000,00, está habilitado e o pagamento brevemente será liberado pela Justiça. Em resumo, está em aberto o pagamento dos créditos trabalhistas reconhecidos em aproximadamente 20 ações individuais, o restante do segundo grupo de funcionários dispensados – os 16 que não receberam integralmente seus direitos – e os depósitos de FGTS que alguns trabalhadores, não depositados durante anos.

FN: Quanto o hospital arrecadou com a venda de ativos e qual a destinação dada aos recursos?
Dr. Altair: O hospital arrecadou aproximadamente R$ 950.000,00 com a venda de três imóveis urbanos – o do laboratório, o do NAPEO e o do estacionamento – sendo esses valores integralmente destinados ao pagamento de dívida trabalhista, como exposto acima. Além disso, o hospital arrecadou pouco mais de R$ 520.000,00 com a venda de uma chácara de cerca de 8 alqueires. O dinheiro obtido com a venda da chácara foi integralmente investido em reformas e ampliações do hospital (Pronto-Atendimento, Centro Cirúrgico, CME e UTI/SUS).

FN: Há previsão para acerto de todos os débitos trabalhistas?
Dr. Altair: Os pagamentos serão realizados na medida da disponibilidade dos recursos financeiros do hospital, seja com renda de alugueis, seja com o valor mensal do arrendamento. Existe uma previsão de que ainda no ano de 2012 todas as dívidas trabalhistas serão quitadas.

FN: Por que não se usou dinheiro da venda da chácara para pagar funcionários?
Dr. Altair: O imóvel, a chácara, foi adquirida por doação e era gravado com impenhorabilidade e inalienabilidade, ou seja, não podia legalmente ser utilizado para pagar qualquer espécie de dívida, nem mesmo trabalhista. A opção pela venda da chácara partiu da inexpressiva renda que o imóvel proporcionava – estava alugada há alguns anos por 1 salário mínimo – e da necessidade premente de melhorar as instalações do hospital, bastante deteriorada pela falta de manutenção. Como o prédio sede do hospital é gravado com as mesmas limitações que possuía a chácara, ou seja, impenhorabilidade e inalienabilidade, a Justiça autorizou a venda do imóvel rural e a reunião do patrimônio da instituição num único bem.

FN: Havia necessidade de reforma?
Dr. Altair: O prédio do hospital precisava de reformas urgentes, especialmente nos setores onde o dinheiro da chácara foi investido (Pronto-Atendimento, Centro Cirúrgico, CME e UTI/SUS). O Centro Cirúrgico do hospital era amedrontador. Não tinha a menor condição de atender dignamente o usuário, tanto que a Vigilância Sanitária Estadual corretamente o interditou. O hospital receberá reforma na pintura externa e passa, atualmente, por reforma emergencial e paliativa em um andar de internação – o 3º, que disponibilizará 41 leitos – com a instalação de ar condicionado split e TV de LCD em todas aos acomodações, inclusive enfermaria SUS. Mas a intenção é ir além. Com o crescimento da demanda, o arrendatário – uma OS (organização social) – assumiu contratualmente a obrigação de realizar uma reforma definitiva nos outros dois andares de internação – 2º e 4º -, com a substituição de piso, louças sanitários e revestimentos de banheiros. O que se quer é oferecer ao usuário em geral, seja ele do SUS, de convênio ou particular, um serviço digno e humano num momento especialmente difícil para as pessoas, o da doença.

FN: Quanto vai custar a reforma do hospital?
Dr. Altair: Nesse primeiro momento, foi investido do próprio hospital pouco mais de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), obtidos com a venda da chácara, e, com esse valor, realizou-se uma verdadeira revolução no Pronto-Atendimento, no Centro Cirúrgico, na CME e na UTI/SUS do São Marcos, tornando esses ambientes irreconhecíveis até mesmo para quem trabalhou durante vários anos no hospital. O arrendatário (a OS) vai custear a pintura externa do prédio e a reforma de um andar de internação. Não tenho informações sobre o custo desses serviços, mas não é muito significativo. Num segundo momento, devem passar por reformas mais profundas todos os andares de internação, de acordo com o aumento da demanda e da taxa de ocupação hospitalar. Todas as dependências do hospital reclamam algum tipo de intervenção, menor ou maior, mas a concretização do projeto de transformar o São Marcos em um hospital-modelo, motivo de orgulho dos que aqui residem, depende de todos, de uma união de vontades, e não somente da vontade da Justiça.