18 mar Supremo derruba regime de pagamento de precatórios
O Supremo Tribunal Federal derrubou, em julgamento nesta quinta-feira (14/3), a Emenda Constitucional 62/2009, conhecida como Emenda do Calote, que alterou o regime de pagamento de precatórios — títulos da dívida pública reconhecidos por decisão judicial definitiva. Estima-se que cerca de 1 milhão de credores tenham mais de R$ 90 bilhões a receber de estados e municípios. Na quarta-feira (13/3), os ministros já haviam derrubado a correção de precatórios por índice da poupança.
A norma questionada prevê o pagamento em até 15 anos, leilões para priorizar o credor disposto a dar mais desconto e a reserva no orçamento de estados e municípios entre 1% e 2% para quitação das dívidas.
O resultado do julgamento foi celebrado pela OAB, autora de uma das Ações Diretas de Inconstitucionalidade que questionavam a emenda. A entidade classificou a decisão como vitória da cidadania. “Com essa decisão, o mínimo que se pode esperar é que as decisões judiciais transitadas em julgado sejam cumpridas pelo poder público”, disse Marcus Vinícius Furtado Coêlho, presidente do Conselho Federal da OAB.
Os votos
Para a maioria dos ministros, não é possível manter o novo regime porque ele prejudica o cidadão, permitindo o parcelamento e a redução de uma dívida que deveria ser paga integralmente e de forma imediata, no ano seguinte à expedição do precatório. Também houve críticas ao comprometimento da autoridade judicial, uma vez que as decisões deixam de ser cumpridas integralmente.
Agora, o Congresso Nacional precisa encontrar outra saída. Com a derrubada da emenda, voltam a valer as regras da Constituição de 1988. “Não se trata de escolher entre um e outro regime perverso, temos que achar outras soluções”, sintetizou a ministra Rosa Weber. A regra anterior previa o pagamento imediato, mas era frequentemente descumprida por estados e municípios, que não sofriam qualquer sanção.
O Supremo começou a analisar o caso em 2011, com o voto do relator, ministro Carlos Ayres Britto (aposentado). Ele criticou a má gestão do dinheiro público, lembrando que muitos estados e municípios gastam mais com publicidade que com o pagamento de precatórios. Após pedido de vista, o ministro Luiz Fux devolveu o processo este ano, acompanhando o relator.
“A criatividade dos governantes tem que funcionar de acordo com a Constituição, sem despejar nos ombros do cidadão o ônus de um problema que nunca foi seu”, disse Fux. Ele defendeu formas alternativas de solucionar os débitos, como pedidos de empréstimos para a União. Seguiram o entendimento de Britto os ministros Rosa Weber, Cármen Lúcia, Celso de Mello e o presidente da corte, Joaquim Barbosa.
A divergência foi aberta ainda na semana passada pelo ministro Gilmar Mendes. Ele entendeu que as novas regras foram uma “vitória”, pois estados e municípios estavam conseguindo quitar as dívidas. Para o ministro Teori Zavascki, embora o novo regime não seja ideal, é um avanço em relação ao anterior, que não colocava percentuais de reserva no orçamento nem punições para quem não cumpria os pagamentos. Dias Toffoli também seguiu a divergência.
O ministro Marco Aurélio concordou com algumas alterações da lei, como a adoção do prazo de 15 anos para vigência do regime especial. No entanto, ele discordou que as regras especiais sejam aplicadas a precatórios a vencer. Posicionou-se contrário também ao método do leilão, que considerou uma “maldade” com os credores. Para o ministro, a única regra possível de pagamento é a ordem cronológica. O ministro Ricardo Lewandowski também disse que o regime especial não deve passar de 15 anos (e apenas com precatórios já devidos), mas não fez qualquer objeção ao sistema de leilões.
O julgamento
Durante o julgamento, acolhendo uma questão de ordem apresentada pelo ministro Marco Aurélio, o STF dividiu o julgamento da emenda duas partes: uma relativa ao artigo 100 da Constituição Federal, que institui regras gerais sobre precatórios, sendo outra parte do julgamento destinado ao artigo 97 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, o qual institui o regime especial de pagamento.
Quanto ao artigo 100, os ministros julgaram inconstitucionais em parte os parágrafos 2º, 9º, 10 e 12, acompanhando o voto do ministro-relator, Ayres Britto (aposentado). No parágrafo 2º, foi considerada inconstitucional a expressão “na data de expedição do precatório”, que restringe o pagamento preferencial àqueles que já têm 60 anos completos quando da expedição do título judicial.
Seguindo o entendimento manifestado pelo relator no início do julgamento, isso significaria que um credor já com 80 anos poderia ficar sem preferência, enquanto outro com 60 anos recém completos poderia ser contemplado rapidamente. Segundo o voto do ministro Ricardo Lewandowski, “excluir da preferência o sexagenário que completa a idade ao longo do processo ofende a isonomia e também a dignidade da pessoa humana e o princípio da proteção aos idosos, assegurado constitucionalmente”.
Os parágrafos 9º e 10 também foram declarados inconstitucionais, por maioria de votos, sob a alegação de ofensa ao princípio da isonomia. Os dispositivos instituem a regra da compensação, no momento do pagamento dos precatórios, dos débitos que o credor privado tem com o poder público. A regra foi considerada inconstitucional porque acrescenta uma prerrogativa ao Estado de encontro de contas entre créditos e débitos que não é assegurada ao entre privado.
Quanto ao parágrafo 12, foi considerada inconstitucional a expressão que estabelece o índice da caderneta de poupança como taxa de correção monetária dos precatórios, por ficar entendido que ele não é suficiente para recompor as perdas inflacionárias. O ministro Marco Aurélio, em seu voto, destacou a constitucionalidade de outro trecho do parágrafo, que institui a regra segundo a qual a taxa de remuneração adotada deve ser a mesma para todos os tipos de precatórios, independentemente da natureza — precatórios alimentares ou de origem tributária — uma vez que o princípio isonômico não comportaria um tratamento diferenciado de taxas para cada caso. Com informações da Agência Brasil e da Assessoria de Imprensa do Conselho Federal da OAB.