Falência provoca suposta venda irregular de bens

Sob processo de falência desde janeiro de 2010 e mergulhada em uma crise financeira que já provocou até o suicídio de um de seus proprietários, a empresa de ônibus Beiradão – conhecida durante mais de 40 anos por fazer o trajeto entre Belém e a ilha de Mosqueiro – está com seu destino nas mãos do juiz da 13a Vara Cível, Álvaro Norat.

O juiz é sério e tem sabido conduzir com serenidade o processo, mas fora dos autos trava-se uma guerra que já redundou na venda de bens da empresa para pagamento de dívidas trabalhistas com ex-funcionários e outras pendências com antigos credores.

Os três sócios da Beiradão já faleceram, deixando um patrimônio que está sendo dilapidado, enquanto os credores pressionam para receber o que tem direito. Alguns ônibus estão sendo vendidos, assim como peças de veículos e equipamentos guardados nas garagens da empresa, tudo sem autorização judicial. Vizinhos da garagem da Vileta, no bairro do Marco, informaram que veículos suspeitos têm sido vistos retirando peças e equipamentos que estão sob guarda da Justiça. Nem a entrega da massa falida à síndica Key Dione Bentes, nomeada pela Justiça, tem impedido as irregularidades. As dívidas alcançam R$ 10 milhões, para um patrimônio de igual valor.

LEILÃO SUSPEITO

Um fato inusitado chama a atenção nesse caso. O empresário Jacob Barata, proprietário da empresa Guanabara, conseguiu arrematar por R$ 1,7 milhão, em um leilão feito pela Justiça do Trabalho, o terreno de quase 3 mil metros quadrados onde está localizada a garagem da Beiradão, na travessa Vileta. O imóvel vale cerca de R$ 7 milhões, segundo avaliações de mercado. O leilão foi realizado para pagar uma dívida de apenas R$ 32 mil que a Beiradão tem com um motorista da empresa.

Os advogados do escritório Maroja, defensores da Beiradão no processo, acabaram obtendo uma liminar no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que anulou o leilão.

Eles alegaram “conflito de competência” com o juízo da 4ª Vara do Trabalho de Belém. O relator do caso no STJ, ministro Sidnei Beneti, afirmou no voto que a competência era da 13a Vara Cível, onde tramita o processo de falência. Só o juiz dessa vara tem poder para promover a execução dos bens da empresa. O mérito da causa deve ser julgado por Álvaro Norat.

Dos 14 ônibus que faziam a linha Belém-Mosqueiro apenas oito se encontram hoje em bom estado. Outros seis veículos literalmente viraram sucata. O mais grave é que ônibus em bom estado estão sendo vendidos por intermédio de anúncios afixados na lataria. O DIÁRIO tentou falar com um homem que oferece os ônibus por R$ 150 mil.

Concorrência quebrou empresa

Depois de três tentativas, uma voz atendeu, negando ser o vendedor dos veículos. Mais tarde, em outra ligação, a mesma voz admitiu que um dos ônibus estava à venda, mas desligou o telefone quando o repórter se identificou.

No começo de 2009, a Justiça começou um processo de recuperação judicial da Beiradão, que alegou passar por dificuldades financeiras devido à concorrência desleal do transporte alternativo irregular para Mosqueiro. A Beiradão chegou a transportar mais de 90% de gratuidades por viagem, faturando a patética renda de R$ 1,00 em um ônibus lotado.

SEM REPASSE

Um relatório contido nos autos do processo mostra que, entre as irregularidades, a empresa recolheu as contribuições previdenciárias dos funcionários, mas não fez o repasse à previdência.

Há ainda dívidas fiscais com o Estado e com o Município. Também faltou a apresentação de uma relação de funcionários e de suas dívidas com eles, além da relação de credores e informações sobre contas bancárias.

No mês passado, durante uma desavença, a administradora judicial Kay Dione Bentes destituiu da massa falida os advogados do escritório Maroja que defendiam a Beiradão no processo.