Cursos fornecidos pelo empregador e a caracterização de jornada extraordinária

A disponibilização de cursos de aperfeiçoamento e aprendizagem por empregadores aos seus empregados é, indubitavelmente, uma atitude elogiável e merecedora de fomento, uma vez que o aperfeiçoamento profissional é também responsabilidade das empresas que, impulsionando-o, promovem a condição pessoal e social do trabalhador e, normalmente, veem a sua produtividade alavancar.

Contudo, há um detalhe que não pode passar despercebido pelo empresariado: os cursos, mesmo que benéficos aos obreiros, quando realizados fora do horário normal de trabalho podem configurar a prestação de horas extras.

E diz-se podem, pois a caracterização da jornada como extraordinária irá depender da natureza do curso disponibilizado e da coercitividade com que são ofertados. Ocorre que os Tribunais Trabalhistas têm entendido, majoritariamente, que a participação em cursos que não guardam relação direta com as atividades da empresa não configuram a prestação de horas extras, mesmo quando as aulas e treinamentos ocorram fora do horário de expediente.

Da mesma forma, a jurisprudência vem se consolidando no sentido de que a participação voluntária do empregado em cursos de interesse, mesmo que direto, da empresa não configura sobrejornada. Importa referir, entretanto, que a adesão voluntária do empregado ao curso, deve ser totalmente despida de pressões, sejam elas manifestas ou não. Exemplificando: não pode o empregado sentir-se coagido, temendo perder alguma promoção ou ver reduzida a sua participação nos lucros e resultados, pela simples recusa em participar do curso ofertado.

Este, sem dúvidas, vem se cristalizando como o entendimento maciço dos nossos Tribunais. Porém, há de ser dito que ainda persiste uma pequena corrente que defende a total desvinculação da participação do obreiro em cursos de aprendizagem e aperfeiçoamento com a sua jornada de trabalho. Para esta vertente, o empregado irá sempre acrescer o seu currículo com a participação nos cursos, independente da natureza dos mesmos, não podendo “receber” para crescer profissionalmente. Ou seja: mesmo que o empregador se beneficie com o resultado da qualificação profissional e, mesmo que não seja o empregado que solicite a frequência nas aulas, o fato do obreiro se beneficiar profissionalmente, descaracteriza o tempo destinado ao estudo como jornada extraordinária.

Tal entendimento, embora respeitável, vem perdendo força a cada dia. Tanto o é, que cada vez mais as Convenções Coletivas de Trabalho de diferentes categorias vêm trazendo previsão expressa de pagamento de horas extras pelo tempo despendido em cursos e treinamentos obrigatórios.

Assim, antes de mais nada, é preciso que o empregador se certifique da (in)existência de previsão neste sentido em cada segmento, para que então, possa mais tranquilamente, analisar aspectos como a correlação do curso com o trabalho desenvolvido e a voluntariedade do funcionário em frequentar as aulas.

E as discussões não param por aqui. Com os constantes avanços tecnológicos e a crescente utilização do EAD – Ensino a Distância – a controvérsia expandiu-se à configuração, ou não, como extraordinárias das horas de aulas frequentadas, de forma on line, pelo empregado em sua própria casa.

Neste contexto, embora seja relativamente nova a discussão e, talvez, precoce a afirmação, o entendimento parece verter para o seguinte posicionamento: se o empregador disponibilizar tempo e condições para a realização do curso durante a jornada de trabalho, mas ainda assim, o empregado optar por realizar o estudo em turno diverso, então não haverá a necessidade do pagamento de horas extras. Ao contrário, caso não reste opção ao obreiro, se não a de assistir as aulas fora de seu expediente, então deverá o período ser pago como extraordinário.

A par desta situação que, confia-se, será cada vez mais recorrente, há de se dizer que, por cautela, o empregador que desejar eximir-se seguramente da responsabilidade de pagar horas extras, deverá utilizar-se dos mecanismos de bloqueio de acesso às ferramentas, impedindo que as aulas sejam assistidas fora da empresa.

Assim, em que pese o louvor na atitude do empregador que busca a qualificação de seu corpo profissional, tem-se que prejuízos desnecessários podem e devem ser evitados. Cabe ao empresariado, independentemente da forma com que os cursos sejam ofertados, precaver-se, inicialmente, tomando ciência do que os instrumentos coletivos da sua categoria disciplinam sobre a matéria, para em seguida, analisar a relação do conteúdo ministrado com a atividade desenvolvida e o interesse do empregado na participação.

Caso não seja de interesse do empregador o pagamento de qualquer hora extra, todo o curso que lhe traga benefícios, mesmo que indiretos e, que não tenha sido solicitados expressamente pelo empregado deverá ser ministrado durante a jornada normal de trabalho.