Aos dez anos, Recuperação Judicial pode acabar no país

O título deste texto é pesado, mas nos faz refletir sobre qual a real amplitude e eficácia deste instituto que completa dez anos e que os críticos dizem só servem efetivamente para grandes empresas.

O mercado financeiro e os investidores em geral possuem aversão a risco. Infelizmente no Brasil, a visão que se tem é que a empresa que obtêm o benefício da Recuperação Judicial está em um estado agonizante e pré-falimentar. Como resultado, não há créditos para estas empresas organizarem seu fluxo de caixa e compromissos futuros.

Em grandes companhias, os interesses em jogo e a complexidade das relações com mercado e com os credores são tão grandes que a quebra teria um efeito negativo.  Neste contexto, as empresas que geralmente possuem bons ativos e um fluxo de caixa robusto, mesmo que deficitário, acabam contando com diversas estruturas financeiras a seu favor para regar a operação, além da benevolência de grandes credores expostos que entendem será melhor colocar mais dinheiro do que perder tudo que foi investido. Os governos e fundos de investimentos que apostaram recursos no desenvolvimento de mercados e grandes corporações não raro  passam por esta encruzilhada.

Os planos de recuperação, quando aprovados, aliviam o caixa e reorganizam a dívida,  mas em geral falam pouco do futuro.  A empresa chegou nessa situação por fatores internos de gestão ou externos de mercado, que levaram há um desencaixe financeiro e um espiral de crise. Quem disse que isso não vai ocorrer de novo?  No Brasil, em 2015 tudo é possível! E assim a vida segue no mercado de crise com decisões judicias que encerram o processo de recuperação judicial em dois anos, mesmo sequer tendo iniciado o período de pagamento.

A Justiça entende que organizou as regras do jogo e o plano agora é auto executável.  Cabe aos credores fiscalizarem a empresa.  Na teoria é ótimo, mas na prática muitas vezes o mesmo modelo de gestão continua e lá na frente apresenta-se um cenário mais agudo. A brecha da lei que visa preservar as empresas tem levado a devedora lá na frente a buscar adaptações e renegociações ao plano aprovado, criando a meu ver um não comprometimento  com o resultado e com o compromisso assumido de pagamento dos credores.

Resta aos credores aceitarem as mudanças e virem novamente à mesa de negociação, caso não queiram a decretação da falência, cujo patrimônio da empresa, quando existente, paga somente parte das dívidas trabalhistas.

Enquanto isso, no mundo das pequenas e médias empresas, o cenário é outro. Recuperação Judicial é sinônimo de mais custo à curto prazo para soluções não tão tangíveis de longo prazo. Sem acesso a crédito e com recebíveis futuros já vendidos e consumidos, com a operação cambaleante, pressão das dívidas fiscais e outros credores não sujeitos a recuperação judicial, o plano de recuperação judicial, montado às pressas, prevê o básico –  deságio e alongamento de dívida, sem ninguém se debruçar sobre o futuro da empresa. Esta, salvo alguma sorte ou mudança real de rumo, pode ter iniciado a sua travessia para quebra.  Como a maioria das empresas no Brasil em crise são médias e pequenas, a Lei terá de rever seus conceitos e sua eficácia senão poderá acabar em desuso para esse grande grupo da economia. Seria mais uma concordata largada na prateleira das leis inutilizáveis no Brasil.