A necessária modernização das relações trabalhistas

O mundo hoje é muito dinâmico. A tecnologia tem um grande impacto nas nossas vidas, influenciando desde as simples formas de interação social aos mais arrojados modos de produção da indústria. Essa evolução tem promovido uma verdadeira revolução no mercado de trabalho. E a legislação – por sua característica precípua de organizar normas, condutas e atribuições – não pode estar dissociada desse processo.

Recém-aprovada, a reforma trabalhista tem a possibilidade, enfim, de equilibrar e modernizar as relações entre patrões e empregados no Brasil. Pode ser um respiro para um país sufocado por decisões judiciais extremamente protecionistas que prejudicam a produtividade dos principais setores da economia, como é o caso da avicultura. O texto altera mais de 100 artigos da CLT, a Consolidação das Leis do Trabalho, promulgada há mais de 70 anos, durante o Estado Novo. Muita coisa mudou desde então.

O principal ponto da reforma talvez seja o que se convencionou chamar de “o acordado sobre o legislado”. O novo texto dá força de lei às negociações entre sindicatos patronais e trabalhistas sobre itens que incluem jornada de trabalho, participação nos lucros e bancos de horas. Isso abre uma franca possibilidade para a formalização de acordos coletivos que interessem de fato a ambas as partes.

A lei atual engessa essas relações, muito pela mão de ferro com que a Justiça do Trabalho e o próprio Tribunal Superior avaliam as deliberações. Com a flexibilização, isso deve ser atenuado. É importante ressaltar que – ao contrário do que parte da imprensa e partidos de oposição ao governo têm dito – não foi promovida nenhuma alteração nos direitos essenciais do trabalhador. A espinha dorsal da CLT se mantém. Questões como décimo terceiro, férias proporcionais remuneradas, multa rescisória, FGTS, e tantas outras, permanecem.

Outro aspecto importante da reforma é o fim do imposto sindical obrigatório. O recolhimento passará a ser voluntário, tanto para o trabalhador como para o empregador, que paga uma alíquota proporcional ao capital social da sua empresa. Essa alteração foi uma das que mais emperraram o andamento do processo. Fragilizados, políticos ligados às centrais sindicais pressionaram o governo para que retirassem do texto final a decisão. Para não perder apoio, o Planalto sinalizou com a inclusão de uma medida provisória que regulamenta a contribuição assistencial – responsável por 70% do orçamento de alguns dos mais de 16 mil sindicatos do país.

Práticas adotadas há tempos serão regulamentadas. É o caso do parcelamento das férias em até três períodos, com a concordância do empregado. Ganham o trabalhador, com maior liberdade de escolha, e o patrão, que pode negociar diretamente com o funcionário, conforme as suas necessidades. A jornada será ajustada até o limite de dez horas diárias (como já prevê a CLT), desde que a compensação ocorra no mesmo mês. Jornadas de 12 horas serão seguidas por 36 horas de descanso ininterrupto. O tempo dos intervalos de almoço também poderá ser negociado. Com a aprovação, o pagamento pelo tempo descontado de uma hora será dobrado (ante o triplicado atual) ou reduzido no final do expediente. Assim, o empregado terá como comer mais rápido e voltar para casa mais cedo.

A polarização político-ideológica impede que muitas pessoas percebam os avanços da reforma trabalhista para o desenvolvimento de toda a população brasileira. Além de garantir maior liberdade às partes, as alterações agregarão dinamismo a todos os elos da cadeia produtiva. Não se trata de uma decisão partidária ou de uma imposição setorial. O projeto atinge pontos nevrálgicos que foram determinantes para a estagnação econômica do país. A aprovação é fundamental para a recuperação do crescimento e para a reversão do quadro calamitoso de 14 milhões de desempregados.

A evolução da vida em sociedade exige adequações. A CLT é um marco no direito trabalhista brasileiro, não há dúvidas, e seguirá valendo como base legal para definir as relações de trabalho no país. No entanto, o texto foi tão modificado ao longo dos anos – ora por necessidade, ora para garantir a manutenção de um Estado historicamente paternalista – que acabou virando uma colcha de retalhos.

Ao contrário do que alguns detratores argumentam, a reforma trabalhista não é uma carta branca ao empresariado para cometer abusos contra a dignidade do trabalhador, muito menos permite a formalização de acordos ilegais. Pelo contrário, o texto passa a limpo, em leis corrigidas e atualizadas, práticas que favorecem o diálogo, a criação de novos negócios, a manutenção de empregos e a sustentabilidade financeira das empresas. Órgãos fiscalizadores seguirão atuantes, como é o caso do Ministério Público do Trabalho.

Com a aprovação das leis que modernizam as relações de trabalho, o Brasil deu um passo importante em direção à recuperação econômica. Enquanto a estabilidade política parece uma miragem, bons ventos sopram no horizonte de quem trabalha com compromisso em busca de uma vida melhor.

Artigo publicado na Revista ASGAV & SIPARGS (nº 52/2017). Leia a edição completa da revista: http://www.youblisher.com/p/1859001-Revista-ASGAV-SIPARGS-52o-Edicao/

 

Marcelo Scalzilli

Sócio | Coordenador da Área Trabalhista e Gestão de RH

marcelo@scaadvocacia.com.br