A (im)penhorabilidade da previdência privada

Questionamento recorrente no cotidiano da advocacia trabalhista, a (im) penhorabilidade dos valores aplicados em Planos de Previdência Privada, ou advindo destes, é um tema que carece de maiores discussões e de uma regularização imediata.

Ocorre que um número sem fim de consumidores “comprou” cegamente o que os planos e bancos lhes vendiam: assim como a maioria dos Tribunais Pátrios entende em relação à aposentadoria advinda do INSS, também o benefício da previdência privada e, principalmente, o capital investido na sua constituição, não poderia ser penhorado para garantir a quitação de qualquer espécie de dívida.

Com o passar do tempo, estes consumidores foram se deparando com uma realidade bastante distinta: muitíssimos juízes e tribunais têm considerado legítima a penhora de tais valores. E no Judiciário Trabalhista, este número aparenta ser ainda maior.

Ocorre que o caráter alimentar das dívidas trabalhistas faz com que a jurisprudência considere penhorável qualquer bem que não seja estritamente vital para a subsistência do devedor.

Mas será realmente que o benefício da previdência privada, ou os valores investidos no fundo para sua constituição são dispensáveis à subsistência do devedor? Principalmente em se tratando de um país em que o teto da previdência pública atinge parcos R$ 4.390,00, tributáveis?

Para um número expressivo de Tribunais do Trabalho, dentre eles o gaúcho, sim! Esta larga fatia da jurisprudência considera que a previdência privada não passa de uma mera aplicação financeira, na qual, via de regra, acumulam-se os valores excedentes às despesas vitais.

Em suma, os defensores da penhorabilidade dos créditos advindos da previdência privada ou de seu fundo defendem que ninguém pode objetivar a melhora na qualidade de vida após a sua jubilação às expensas dos créditos alimentares daqueles que, em geral, são mais necessitados.

Cientes da relevância e pertinência de tais argumentos, defendemos, contudo, que assim como o benefício advindo do INSS (em regra), também a previdência privada deve ser considerada impenhorável. Isto porque, o seu intuito é justamente o de “complementar a ação do Estado em matéria previdenciária, lastreando-se na constituição de capital para a concessão dos benefícios. Em tal senda, quando alguém realiza investimentos para o futuro, através de plano de previdência, está, em verdade, pretendendo benefício previdenciário e não mera aplicação financeira” . O entendimento aqui defendido, embora minoritário, não é isolado. Ao contrário, é avalizado pela linha de jurisprudência que vem sendo trilhada pelo TST.

Ademais, não se pode esquecer, que assim como o benefício advindo da previdência pública, também o benefício da previdência complementar não resguarda apenas o segurado, mas também os seus dependentes e familiares. Por esta razão, sustentamos a impenhorabilidade dos fundos e rendimentos da previdência privada, especialmente se os depósitos sejam provenientes de salários ou honorários que, por força de lei, são impenhoráveis.

Ou seja, rendimentos impenhoráveis se transformam em capital impenhorável .

Por fim, entendemos que, obviamente, esta impenhorabilidade não pode ser absoluta, comportando a relativização diante do caso concreto. Sendo mais claras: não pode, por exemplo, o segurado destinar voluptuosos capitais para o fundo de previdência privada, para, à luz da impenhorabilidade, despir-se de qualquer patrimônio exigível por seus credores.

A Justiça do Trabalho, por certo, não poderia admitir situações fraudulentas como esta. Contudo, cremos que quando o investimento é dotado de lisura e legalidade, então deverá ser entendido como uma extensão da aposentadoria pública, de caráter nitidamente alimentar e impenhorável, não servindo para a quitação de dívidas de qualquer natureza, nem mesmo as trabalhistas.

Até porque, não há justiça quando se tira o alimento de um, para saciar a fome do outro.