Publicidade nas relações consumeristas

Dentro do universo consumerista – e atentos com o desenvolvimento da vida moderna, de apelo excessivo da mídia em publicidade e propaganda difundido nas ruas, veículos de comunicação e redes sociais – nos deparamos com situações tipificadas como práticas publicitárias abusivas e enganosas. Neste cenário, figura o consumidor, muitas vezes classificado como vulnerável e hipossuficiente frente a tais práticas.

No entanto, pode-se realmente enquadrar todo e qualquer consumidor nos conceitos descritos pela legislação, ou, ainda, pode-se dizer que todo o consumidor é vulnerável e ao mesmo tempo hipossuficiente? Logicamente, as expressões possuem definições distintas, mas frequentemente denotam-se de precedentes jurisprudenciais os termos empregados como sinônimos, o que pode acarretar impropriedades.

Nesse sentido, a análise fática e a condição particular de cada caso em concreto, análise vagarosa do consumidor e da empresa demandada não devem ficar adstritos a tais “rotulações”, não podendo o consumidor invariavelmente ser considerado desinformado, tampouco a empresa como ente superior, usando do seu poder e do sistema capitalista para beneficiar-se de situações a custa de clientes e consumidores mais frágeis na relação, ou “hipossuficientes”.

Conforme o Art. 4º, inciso I do CDC, todo consumidor presume-se vulnerável, sendo a vulnerabilidade muito mais que um estado de espírito da pessoa, uma situação permanente ou provisória, coletiva ou individual, que de certa forma fragiliza a relação entre consumidor e fornecedor, pretensão esta iuris et jure, ou seja, incontestável. Pensamos que afirmar incontestabilidade pode gerar insegurança ao sistema de aplicação do CDC, pois manifestamente imperativa, não podendo se questionar sua aplicabilidade, como, por exemplo, sujeitos que somente ventilam situações, sem trazer a prova que lhes cabe, acarretando assim à sociedade e às relações de consumo insegurança jurídica.

Acompanhando esse posicionamento, Claudia Lima Marques aduz que em se tratando de uma relação entre o fornecedor e um consumidor não profissional seria uma presunção absoluta, ao passo que se tratar de uma relação entre fornecedor e um consumidor profissional, tal vulnerabilidade deveria se evidenciar no caso concreto.

Na moderna sociedade em que vivemos, pessoas são transformadas, frente ao volume de negócios gerados por mídias e grandes empresas, em números e estatísticas, de modo que as novas técnicas de venda de produtos e serviços, abusivas em sua concepção, têm flagrado violações ao direito dos consumidores. A publicidade a cada dia informa menos; e, ao contrário, se utiliza de técnicas de marketing induzindo ao erro as mensagens e até mesmo a criação de necessidades supérfluas aos consumidores.

Dentro desse contexto, é de suma importância destacar o direito de acesso à informação, direito este que possui caráter individual, subjetivo, qualificado como direito essencial à pessoa humana, a qual se insere em um estado democrático de direito, conforme prevê a Constituição Federal.
Ainda, há também presente o papel da boa fé e da transparência no mercado de consumo, e também uma nova tendência e um novo perfil identificado neste mercado, o consumidor proativo, que busca e pesquisa informações nos mais diversos meios de comunicação para realizar um bom negócio, que nem sempre pode ser enquadrado no conceito de vulnerável.

É inegável que, no mundo moderno, a publicidade exerce papel relevante no exercício de vontade das pessoas e dos consumidores. Contudo, com a vasta tecnologia e o ilimitado acesso a informação é inevitável se questionar se a boa fé e a transparência por vezes não acabam realmente invertendo papéis, como dito anteriormente. Afinal, o consumidor, seja com a mídia, jornais ou internet, é manifestamente privilegiado com acesso a informações confiáveis, como as instruções do PROCON, Reclame Aqui, entre outras instituições voltadas à proteção e defesa do consumidor, dentro de um contexto de globalização do acesso a informação.

Assim, as empresas, atentas ao que dispõe a lei consumerista, bem como a legislação esparsa, possuem uma ferramenta de grande repercussão, a publicidade, que, se utilizada de forma adequada, resultará na sua diferenciação e posicionamento no mercado e consequentemente em ganhos para a empresa.

Logo, as empresas, devem utilizar-se do que há de melhor na qualidade e clareza das informações dispostas nas campanhas de marketing, possibilitando a seus clientes consumidores informações válidas e de fácil compreensão, que efetivamente resultarão em credibilidade da empresa no mercado, transparecendo sua boa fé, ética e a qualidade do serviço ou produto lançados no mercado de consumo.
 

Tom Guilherme Warth, Advogado, OAB/RS 88.997.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade (Org.). Responsabilidade civil: indenizabilidade e direito do consumidor. São Paulo: R. dos Tribunais, 2010. v. 4. p. 369.
BENJAMIN, Antônio Herman; MARQUES, Claudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de direito do consumidor. São Paulo: R. dos Tribunais, 2007. p.85.
 BESSA, Leonardo Roscoe. Relação de consumo e aplicação do código de defesa do consumidor. Revista Dos Tribunais. 2ª Ed. 2009. p.31. O autor inclusive destaca a violação dos direitos do consumidor, que os contratos em vez de serem discutidos em sua formação, já vêm prontos e com várias desvantagens ao consumidor, igualmente muitos produtos em série com defeitos, que geram danos ao consumidores, o avanço da tecnologia que da mesma forma acaba gerando um déficit de informações ao consumidor nos contratos, ou até mesmo a indução em erro em determinada contratação.
A boa fé significa, portanto, uma atuação “refletida”, uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização do interesse das partes. MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. p. 372 e 373.
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5. ed. São Paulo: R. dos Tribunais, 2006. p. 719.

 

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