Gilmar Mendes: decisão pró-aborto leva STF a ser menos ortodoxo

Pouco antes do início do julgamento sobre aborto de fetos anencéfalos, realizado nesta quarta-feira, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes classificou a matéria como uma das mais importantes a serem submetidas ao tribunal nos últimos anos. O ministro disse ainda que, caso a decisão do STF seja favorável, a Casa terá que avançar para um modelo “menos ortodoxo ou mais heterodoxo”, produzindo uma sentença de caráter normativo ou aditivo.
Anencefalia: quanto tempo é possível sobreviver sem cérebro?

“Às vezes, o STF emite juízos de caráter normativo à falta de normas para regular procedimentos. Talvez possa ser este um dos casos”, destacou. “Vamos então discutir com serenidade, ouvir a manifestação dos requerentes, dos amicus curiae (amigo da corte) e ver como se encaminha, ver qual vai ser o posicionamento”, ressaltou. “Vamos aguardar o desenvolvimento da temática no plenário para que e gente tenha maior segurança. Acredito que vamos concluir hoje ou amanhã esse julgamento.”

Sobre a ausência de manifestação de representantes de entidades contrárias ao aborto de anencéfalos na tribuna, Gilmar Mendes avaliou que o tema divide a sociedade e que deveria ter sido dada voz a todos os segmentos envolvidos. “Não entendi porque houve esse indeferimento”, disse.

O julgamento
O processo julgado no STF nesta quarta-feira foi movido em 2004 pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que pede para explicitar que a prática do aborto, em caso de gravidez de feto anencéfalo, não seja considerada crime.

Atualmente, o Código Penal prevê apenas duas situações em que pode ser realizado o aborto: em caso de estupro ou de claro risco à vida da mulher. A legislação proíbe todas as outras situações, estabelecendo pena de um a três anos de reclusão para a grávida que se submeter ao procedimento. Para profissional de saúde que realizar a prática, ainda que com o consentimento da gestante, a pena é de um a quatro anos.

Em 2004, o ministro Marco Aurélio concedeu liminar para autorizar a antecipação do parto quando a deformidade fosse identificada por meio de laudo médico. Porém, pouco mais de três meses depois, o plenário decidiu, por maioria de votos, cassar a autorização concedida. Em 2008, foi realizada uma audiência pública, quando representantes do governo, especialistas em genética, entidades religiosas e da sociedade civil falaram sobre o tema.

A anencefalia é definida na literatura médica como a má-formação do cérebro e do córtex do bebê, havendo apenas um “resíduo” do tronco encefálico. De acordo com a CNTS, a doença provoca a morte de 65% dos bebês ainda dentro do útero materno e, nos casos de nascimento, sobrevida de algumas horas ou, no máximo, dias.