Entidades veem MP do trabalho como alívio a empresas e empregados

Fonte: Jornal do Comércio

 

medida provisória (MP) apresentada nessa quarta-feira (1º) pelo governo federal foi recebida como alívio por entidades empresariais e de representação de trabalhadores no Rio Grande do Sul. A iniciativa para enfrentamento à crise econômica gerada pela pandemia do novo coronavírus permite às empresas reduzir jornadas e salários, ou suspender contratos de trabalho e pagamentos por até dois meses.
Um dos setores mais afetados pelas restrições diante dos decretos de isolamento social é o comércio, pela grande quantidade de trabalhadores que emprega. No Rio Grande do Sul, as lojas deverão ficar fechadas pelo menos até 15 de abril. O consultor trabalhista da Fecomércio-RS, Flavio Obino, diz que a MP foi bem recebida por permitir maior flexibilização e acordo direto entre empregador e trabalhador, além do beneficio emergencial do governo.
«Existe um dogma das empresas de não aceitarem a garantia de emprego, mas é uma medida excepcional e necessária neste momento. As entidades são sensíveis à crise que se atravessa e continuaremos buscando outras alternativas», afirmou Obino.
O presidente da CUT-RS Amarildo Cenci avaliou positivamente a MP por dar «uma mão ao trabalhador», mas cobrou agilidade na sua implementação. «O que se precisa é que ela seja implementada o mais rápido possível. As pessoas estão precisando agora», comentou.
Cenci, no entanto, acredita que a medida deveria analisar quais os setores da economia terão as maiores perdas e aplicar regras para cada caso. «Tem de se fazer um caso a caso. Não adianta antecipar o desemprego. O governo tem de pensar por segmento, por renda, por parcela que mais mais emprega ou não, para conseguir reduzir os reflexos da crise», avaliou.
O consultor da Fecomércio-RS disse que as entidades associadas vão seguir trabalhando para eventuais ajustes na medida, como o limite de renda para os acordos individuais. Segundo a MP, a suspensão dos contratos via negociação entre empregador e empregado só pode ser feita com quem recebe até três salários mínimos (R$ 3.135,00). «Torcemos para que as empresas tenham condições de usar essas medidas e não tenham que recorrer a demissões», disse Obino.
Já o presidente da CUT-RS sugere uma outra medida adicional, que é alterar, excepcionalmente, a faixa do Imposto de Renda para R$ 3 mil, aumentando o nível de isenção.
Outra crítica de Cenci é à MP anunciada na semana passada, que prevê empréstimo às pequenas e médias empresas para a folha de pagamento. O presidente defende que o Tesouro teria de bancar integralmente este custo, ou, em caso de empréstimo, aplicar juro zero. «Senão, é uma mão estendida pro sistema financeiro?», questionou.

Juristas divergem sobre a constitucionalidade da MP do trabalho

Foi também com alívio a advogada Kerlen Costa leu o texto da Medida Provisória (MP) editada pelo presidente. Ela advoga no escritório Scalzilli Althaus, especialista em direito empresarial e relatou “uma situação de milhares de demissões por dia. As empresas não estão faturando, não sabem quanto tempo vai durar e precisava de uma medida imediata”.
Umas das principais discussões no mundo jurídico, porém, é sobre a constitucionalidade da MP. Alguns especialistas afirmam que a medida fere o artigo 7º da Constituição Federal (CF), que garantiria a irredutibilidade salarial do trabalhador.
Para o advogado trabalhista Antônio Vicente Martins, esse “talvez princípio mais importante na defesa trabalhadores”. “Ele proíbe a redução de salário, como um direito, e cria uma exceção: redução através de acordo coletivo”, explica.
A MP define que a redução na jornada de trabalho e, proporcionalmente, no salário poderá ser de 25%, 50% ou 70%. Ela permite que a redução seja firmada por acordo individual com empregados que recebem até três salários mínimos (R$ 3.135) ou mais de dois tetos do INSS (R$ 12.202,12) e que tenham curso superior.
Para Martins, “a MP viola um direito básico dos trabalhadores”. “A CF fala em irredutibilidade exatamente porque quer priorizar e defender as negociações coletivas. O emprego não tem paridade negocial com o empregador. A medida é claramente ilegal”, opinou o advogado.
A advogada discorda. “Nós vivemos uma situação excepcional. Eu não entendo como inconstitucional porque nunca vivemos essa situação de pandemia”, disser Costa. Para ela, “em motivos de força maior, é possível sim negociar com o trabalhador se o motivo é garantia do emprego”.
“Logo de manhã cedo e já tinha gente nos ligando para suspender demissões”, continuou. “A proprietária de uma cafetaria me ligou e disse que a medida poupou 15 empregos lá”, exemplificou Costa.
Para Martins, porém, a MP “provoca e vai provocar profunda insegurança jurídica. Quem adotar as medidas sem passar por negociação coletiva vai estar sujeito a isso depois”.
“O governo teria várias possibilidades respeitando CF, como possibilitar que empregadores e sindicatos ajustarem as condições que devem ser observadas. Em vez disso, o governo ignora propositalmente um dispositivo da Constituição.”, colocou o advogado.
Costa concorda que “pode haver problemas na justiça mais para frente”, mas observa que “as empresas não estarão contratando após pandemia, pois economia estará abalada, então o trabalhador pode ficar sem emprego até o final do ano”. Para ela, a medida ajudará as empresas a manterem seus funcionários.
Ainda diz que “a MP é bem confusa, ainda vai gerar discussão, mas estamos contando com bom senso dos juízes”.
Já segundo Martins, é justamente enquanto o país “enfrenta uma pandemia, um momento grave crise coletiva é que a constituição é a garantia que temos que preservar determinado direito além de tudo. A CF, então, precisa ser preservada”.

 

Kerlen Costa

Advogada Trabalhista